‘Erro de cálculo na Ucrânia’, a mensagem a Putin em discurso de Biden

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Anthony Zurcher
Correspondente da BBC News na América do Norte

O presidente americano Joe Biden passou os primeiros 15 minutos de seu tradicional discurso sobre o estado da União, na terça-feira (1º/03), falando sobre a invasão da Ucrânia pela Rússia, um evento que certamente impressiona o mundo muito mais do que os últimos desdobramentos de sua agenda legislativa para os assuntos internos dos Estados Unidos.

Embora o discurso anual seja considerado uma mensagem ao Congresso, os comentários de Biden este ano sobre a Ucrânia foram feitos tendo em mente quatro públicos distintos — com quatro mensagens distintas.

No início de seu discurso, Biden mencionou a embaixadora ucraniana nos EUA, Oksana Markarova, que estava sentada no Congresso ao lado da primeira-dama, Jill Biden, e outros convidados ilustres.

“Obrigado, obrigado, obrigado”, disse ele, enquanto os membros do Congresso aplaudiam.

Os EUA enviaram ajuda militar, econômica e humanitária à Ucrânia — mas não enviaram tropas, como pede o governo ucraniano. Biden queria enviar uma mensagem de que os EUA se preocupam com o destino da Ucrânia.

“Desde o presidente Zelensky até todos os ucranianos, seu destemor, sua coragem e sua determinação inspiram o mundo”, disse ele.

Com Kiev cercada por tanques russos, sua mensagem é de que mais ajuda americana pode estar a caminho.

A mensagem de Biden a Vladimir Putin foi simples — o presidente russo “calculou errado”. Ele disse que a dor econômica que os EUA e a Europa vão impor à Rússia está apenas começando. A cotação do rublo e as ações de empresas russas estão em queda, os bilionários russos estão tendo seus “ganhos ilegítimos” confiscados e a Rússia está perdendo acesso à tecnologia.

Além da mensagem sobre “dor econômica”, havia outro recado para a Rússia no discurso de Biden. O presidente americano enfatizou que os EUA e seus aliados lutariam para defender “cada centímetro do território dos países da Otan”.

Putin colocou suas forças nucleares em alerta máximo e avisou sobre consequências “devastadoras” caso qualquer nação defenda a Ucrânia. A mensagem de Biden serviu para esclarecer, e para não deixar qualquer dúvida, em quais termos os EUA pretendem participar do conflito.

Os EUA e seus aliados europeus estão em sintonia ao impor sanções à Rússia e oferecer ajuda militar à Ucrânia. Ao longo de durante seu discurso, Biden comemorou esse fato.

“Ele achou que o Ocidente e a Otan não responderiam”, disse o presidente. “Putin estava errado. Estávamos prontos.”

Putin pode ter tido a impressão de que os EUA e a Europa não estariam preparados para lidar com a invasão da Ucrânia, sobretudo depois da retirada caótica de tropas americanas do Afeganistão no ano passado, que gerou fortes críticas a Biden por não ter consultado seus aliados. Este foi um tópico que o presidente dos EUA evitou durante seu discurso.

A ênfase de Biden no papel fundamental que a Europa vem desempenhando na resposta à invasão da Rússia pode ser parte do esforço do seu governo para acalmar relações desgastadas entre aliados.

Ao longo de sua presidência, Biden falou repetidamente sobre o que ele vê como um conflito global que define uma era entre democracias e autocracias. Biden disse que as democracias do mundo precisam cooperar entre si.

“As democracias estão à altura do momento e o mundo está claramente escolhendo o lado da paz e da segurança”, disse Biden.

Uma pesquisa de opinião pública divulgada na terça-feira (1º/03) mostrou que a maioria dos americanos estava interessada em ouvir o que Biden tinha a dizer sobre o conflito na Ucrânia. A mensagem de Biden foi de que a resposta global unida — da Ásia à América Latina, Europa e até Suíça — é uma prova do sucesso dos esforços de seu governo.

“A diplomacia americana importa. A determinação americana importa”, disse Biden.

Uma das promessas de campanha de Biden foi restaurar a posição dos EUA no mundo e reconstruir as relações tensas com aliados após os tumultuados anos de Donald Trump. O que se vê agora, Biden insinuou, são resultados tangíveis desse esforço, vindo no momento de maior perigo.

Biden também tinha uma mensagem para os americanos que podem estar preocupados com a possibilidade de que os soldados dos EUA estejam em risco no conflito ucraniano. Enquanto ele explicava as obrigações dos EUA para com os aliados da Otan, sua mensagem sobre o que os EUA fariam na Ucrânia também era direta: as forças americanas “não estão envolvidas e não entrarão em conflito com as forças russas na Ucrânia”.

Por fim, Biden teve que abordar o que certamente será o aumento das dificuldades econômicas que os americanos enfrentarão por causa do conflito na Ucrânia — dificuldades ainda maiores somadas às da pandemia de covid-19 e outras que podem ter um preço político para um presidente. cuja posição diante do público dos EUA já é fraca.

Ele disse que os EUA tentarão elaborar sanções para atingir a economia russa, mas que os custos para o resto do mundo serão inevitáveis. Ele anunciou que os EUA liberarão 30 milhões de barris de petróleo de sua reserva estratégica, mas esse movimento é mais simbólico e dificilmente atenuará o aumento do preço do gás para os consumidores americanos.

“Eu sei que as notícias sobre o que está acontecendo podem parecer alarmantes, mas quero que vocês saibam que vamos ficar bem”, disse.

Essa pode ser a mensagem mais importante para o futuro político de Biden. Se o público americano não se sentir bem, o presidente e seu partido poderão sofrer as consequências disso já nas eleições parlamentares de novembro deste ano.

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